O que
esperar do Brasil comparando com a experiência da França, Alemanha, Espanha e
do Uruguai.
A
recente mudança na legislação trabalhista brasileira vem causando inquietação.
Alguns a consideram um avanço para a economia, outros um retrocesso
(precarização é uma palavra constante) nos direitos que garantem as condições
sociais dos trabalhadores. Esse debate entre capital e trabalho é bem antigo,
mas, nos últimos anos, ganhou velocidade pelo mundo.
De
fato, recentemente houve mudanças na legislação laboral de dezenas de países
pelo mundo, em especial após a crise financeira mundial iniciada 2008.
Este
artigo paz um paralelo entre mudanças/expectativas da reforma trabalhista
brasileira com as da França, Espanha, Alemanha, Chile e Uruguai.
Reforma
trabalhista na Espanha: o exemplo perseguido por Temer.
A
grande semelhança com a reforma brasileira é a redução no poder de negociação
dos sindicatos, porem a Espanha não operou mudanças tão profundas.
Considerada
o modelo que o Brasil seguiu, iniciada em 2012, e por lá, reduziu o desemprego
de 23,5% para o “incrível” índice de 18,6%. Mas vale lembrar que enquanto a
Espanha em 2011 tinha um índice de 23,5% de desemprego, o Brasil vivia o pleno
emprego (sem mudar a legislação trabalhista), e mesmo hoje, em meio a recessão,
o índice está na casa dos 13%.
O juiz
José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva, traz resultados alarmantes obtidos em
sua tese de doutorado em Direito Social, defendida na Universidad Castilla-La
Mancha, na Espanha, em que compara as relações de trabalho neste país com as
observadas no Brasil. Ao qual mesmo com pouco tempo de aplicação na nova
legislação o ainda há um alto desemprego e elevadas taxas de acidentes de
trabalho e de doenças ocupacionais, segundo ele, devido a jornadas de trabalho
extensas, sem as pausas saudáveis.
O foco
principal era reduzir o número de contratos temporários e aumentar o de
empregos permanentes. O meio encontrado foi dando mais poder de negociação para
os empregadores em frente aos sindicatos, e o resultado foi uma cosmética
redução no índice de desemprego e uma notória precarização dos empregos e
redução de salários.
O FMI
elogiou a reforma, mas reconheceu o problema da precariedade do emprego e dos
reduzidos salários, embora propondo como solução outra reforma trabalhista,
porém, desde 1980, a Espanha já fez dezenas de alterações em sua legislação
trabalhista, todas sem sucesso, não solucionando o problema do desemprego
crônico nem do elevado número de trabalhadores temporários.
Reforma
trabalhista na França: o acordado sobre o legislado.
Entrou
em vigor em agosto de 2016, tem por base um dos fundamentos da ideia central da
reforma brasileira, além deste ponto, outro que merece destaque é a mudança na
quantidade de horas de trabalho semanal permitida, que era de 35 e agora subiu
para 48 horas, podendo chegar a 60 horas com o pagamento de horas extras.
Carlos
Yárnoz, destaca alguns dos principais pontos. “Apesar de não revogar a sagrada
lei das 35 horas de trabalho semanal, o projeto a
dinamita por meio dos fatos. Além disso, amplia e facilita as demissões por
motivos econômicos – quatro trimestres de prejuízos ou declínio no faturamento
– e reduz os tetos das indenizações por demissão – 15 meses de salário em vez
de 24 a 27 para os trabalhadores com mais de 20 anos de casa. Além disso, os
acordos entre a comissão sindical e os patrões em cada empresa ficarão acima
dos acordos setoriais, o que enfraquece as organizações de trabalhadores. “
Para o
pesquisador da Universidade de Paris Nicolas Chenevoy, as negociações coletivas
são mais eficientes em determinar as relações de trabalho diante das mudanças
tecnológicas que afetam o mercado. “O problema hoje é adaptar o marco jurídico
à mesma velocidade que as transformações introduziram ao mercado frente às
novas tecnologias”, disse. Para o pesquisador, empresas e trabalhadores se
beneficiam com a nova legislação.
Reforma
trabalhista na Alemanha: sem comentários!
A
reforma trabalhista alemã é um exemplo de um relativo sucesso que dificilmente
foi vista pelo mundo. Diferente da que se faz no Brasil, na Alemanha foi feita
de forma bem estruturada, ao longo de anos, em várias etapas e ainda por meio
de acordos entre de sindicato, empregadores e governo.
Após a
já consolidada reforma, reduziu o desemprego, que estava em 10% antes das
mudanças, mas a redução ficou aquém do esperado, segundo o pesquisador da
Organização Internacional do Trabalho, Daniel Samaan.
A
Alemanha que chegou a ser chamada de “A velha senhora doente” da Europa,
passava por uma grave crise no final dos anos 90, após sua unificação. Através
de um plano de reestruturação econômica chamado de Plano Hartz, iniciado em
2003, que se dividiu em várias fases e ao longo delas modificou aos poucos a
legislação trabalhista, juntamente com outros fundamentos da economia.
Iniciado
em 2003 e dividido em 4 pilares. O Plano Hartz seguia a cada intervalo de
alguns meses, com a aprovação de novas leis com determinadas mudanças chamadas
de: Hartz 1, Hartz 2, Hartz 3 e Hartz 4. É importante destacar que ao mesmo
tempo que as leis eram debatidas e aprovadas, o então Chanceler Schroeder dava
seguimento ao plano Agenda 2010 para a Alemanha, mas de forma conjunta na
restruturação.
Foi uma
modificação gigantesca na legislação social da Alemanha. O Plano Hartz Incluiu
mudanças nos planos de saúde, aposentadoria, nos seguros, leis trabalhistas e
em outros diversos pontos.
A
apreciação da legislação trabalhista modificada na Alemanha é complexa de ser
avaliada pela realidade laboral brasileira, neste ponto deve-se levar em
consideração a construção do DNA (não falo de genética) de cada nação.
Analisado por uma equação que considera sua evolução histórica, costumes,
cultura e outros fatores.
Para
tanto, vou citar apenas a principais mudanças de cada etapa.
O
trabalhador alemão tem o contrato de emprego permanente (semelhante aos nossos
servidores públicos) se baseando em uma legislação bem restritiva, no Plano
Hartz 1 o contrato de trabalho foi simplificado, permitindo contratos
temporários, mas determinando que esses trabalhadores teriam os mesmos direitos
dos empregados permanentes.
O plano
Hartz 2 lidou com os empregos em tempo parcial, com menos de 15 horas por
semana. O sistema era muito oneroso para a empresa contratar nessa modalidade,
que era obrigada a pagar taxas que inviabilizavam esse contrato de trabalho em
tempo reduzido. As regras então foram revistas, dando melhores condições para o
empregador contratar nesta modalidade.
Quanto
ao Hartz 3 e o 4, foi uma reestruturada nas agências de contratação de
empregados e no seguro desemprego. Outra vez simplificam um sistema que antes
era complexo, unificando as agências de contratação e recolocação de
desempregados, e ainda reduziram o número de parcelas do seguro desemprego de
24 para 12 parcelas.
As leis
em comento, foram criadas numa realidade social do pós-guerra, e neste ponto
reitero, não podemos imaginar os desafios da reestruturação e posteriores
fundamentos da sociedade alemã sob o prisma brasileiro.
Reforma
trabalhista no Uruguai: a Suécia da América do Sul
É
conhecida como uma das legislações mais inteligentes e atuantes do mundo,
ombreando com Suécia e Dinamarca.
Com
mudanças significativas em sua legislação nos últimos dez nos. Se vale de
práticas como a reconvocação do Consejo de Salarios, instituído nos anos 1940
para fixar o salário mínimo e outras condições laborais, uma assembleia com
representantes do governo, dos trabalhadores e dos empregadores. Assim como na
Alemanha, existe uma noção de trabalho conjugado.
O
advogado e professor uruguaio Mário Garmendia Arigon ministrou em 2012, a
convite do desembargador Manoel Carlos Toledo Filho, no auditório da Escola
Judicial do TRT-15, em Campinas, a palestra "Atualidades e desafios do
sistema trabalhista uruguaio", na ocasião apresentou normas trabalhistas
que vem sendo aprovadas desde 2005 em seu país, como a lei que torna nula
qualquer ação ou omissão do empregador em que se evidencie a perseguição ou a
discriminação do trabalhador por motivos sindicais; a lei de 2007 que ampliou
de dois para cinco anos o prazo de prescrição dos direitos trabalhistas durante
a vigência do contrato de trabalho (opa, essa já é bem conhecida no Brasil,
prescrição quinquenal); a lei, sancionada em 2007, que estabeleceu a
responsabilidade solidária do tomador de serviços por obrigações trabalhistas
não honradas pela empresa prestadora. Esta última norma, explicou o
palestrante, foi substituída, em 2008, por outra que lhe modulou os efeitos,
para converter em subsidiária a responsabilidade da empresa tomadora que
comprovar o exercício de seu dever de vigilância sobre a empresa prestadora.
Um dos
recentes avanços na legislação, ocorrido em 2009, que Garmendia destacou foi o
desmembramento do processo trabalhista do âmbito civil (semelhante ao modelo
que o Brasil adota a décadas), segundo o distinto jurista em 1990 todos os
processos de natureza civil (comercial, de família, trabalhistas) foram
fundidos em um único processo, disciplinado no "Código General del
Proceso". Porém, inspirados na ideia de celeridade processual, "valor
essencial que se impõe ao processo nessa matéria” a lei foi reeditada, e o
processo trabalhista passou a ser um processo específico.
O
jurista Uruguaio faz um balanço positivo da legislação recentemente alterada em
seu país, afirmando que contribuiu para melhorar as condições de trabalho e de
vida dos trabalhadores, mantendo o equilíbrio econômico, assim como para
aumentar o prestígio do direito do trabalho no país.
Garmendia
pontua ainda, que os desafios colocados pela nova realidade, se destaca a
importância de equilibrar as relações entre política e direito. E ainda
advertiu." A política não pode se impor ao direito. "De acordo com o
palestrante, vemos atualmente o predomínio das soluções políticas sobre as
soluções jurídicas quando se trata de conflitos coletivos (lembrando que a
palestra é de 2012)."Num clima de coação, contudo, não há entendimento
eficaz. Quem tem mais força negocia a seu favor”. Segundo Garmendia, na
resolução de um conflito coletivo, deve-se trilhar o caminho que encontre a
solução menos traumática possível para as partes, o equilíbrio na negociação
entre os envolvidos, mediante a utilização de critérios como a racionalidade, a
conveniência e a oportunidade, entre outros. Nesta panorâmica, afirmou que o principal
desafio a ser enfrentado pelo país nesse campo é "a reconstrução da
confiança no instrumento jurídico como garantia última da convivência em
sociedade, amparando quem tem razão, que nem sempre é quem detém a força. Não
existe outra resposta à crise do direito que o próprio direito. Este é o único
caminho para responder à complexidade social", concluiu o jurista.
Como se
vê, o grande destaque do Uruguai está num trabalho constante, por meio de
atualizações constantes na legislação, ocorridos por meio de um debate com a
sociedade, que nem sempre encontra a melhor solução, mas que diante de um
problema evidenciado, se toma uma solução, reeditando a legislação. O que não
ocorre no Brasil, que com essa reforma, busca em um único ato, através de um
momento político duvidoso, acertar de forma drástica todo cormo legislativo
construído ao longo de diversos avanços sociais, processuais e econômicos.
Conclusão
Sem a pretensão de esgotar o tema, pode-se concluir que o modelo
adotado para a recente atualização legislativa na seara laboral brasileira, se
mostra drástico e muito profundo, se comparado com as reformas trabalhistas
ocorridas pelo mundo nos últimos anos. Pois apesar de abordar de forma acertada
a revogação de leis ultrapassadas e edição de vários dispositivos legais
alinhados com a moderna relação laboral, não poderia em um mesmo lapso temporal
impor que o acordado se sobreponha ao legislado e reformular o sistema sindical
(de forma inquestionavelmente acertada), sem minimamente ter o tempo necessário
para uma reestruturação.